terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Jarbas Vasconcelos despede-se do Senado

 
jarbas-vasconcelos - foto waldemir barreto-agência senado

O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) despediu-se hoje (1º/12) do Senado e como escolheu uma segunda-feira para fazer o seu discurso, encontrou o plenário praticamente vazio.
A partir de fevereiro, ele estará na Câmara Federal como o terceiro deputado mais votado de Pernambuco e o segundo do PMDB, no Brasil, tendo perdido apenas para Eduardo Cunha (RJ).
Em um dos trechos do seu discurso, o senador pernambucano disse o seguinte:
“Estarei (na Câmara) na defesa da estabilidade econômica, pressuposto fundamental para combater a miséria e tirar da pobreza os milhões de brasileiros e brasileiras que ainda estão de fora do processo produtivo. Como deputado federal representando o povo de Pernambuco, não me calarei diante das tentativas de esvaziar a força da democracia representativa; não ficarei omisso quando tentarem calar a Imprensa; não fugirei do embate para impedir o controle hegemônico das instituições democráticas.”

Leia, abaixo, a íntegra do seu discurso:
Senhor Presidente,
Senhoras Senadoras e Senhores Senadores,
Há quase oito anos, cheguei a esta Casa com a esperança de que o nosso País conseguiria trazer para a política os avanços obtidos em outras áreas da sociedade brasileira. Infelizmente, isso não ocorreu. A política perdeu com a degradação dos governos do PT, que deixou de lado a ética que professava quando estava na oposição para lutar pela permanência no poder usando todas as armas que estiverem ao seu alcance.

Os escândalos de corrupção se multiplicaram, passando a fazer parte da paisagem cotidiana; a fragmentação partidária atingiu números alarmantes e, em que pese as punições do Supremo Tribunal Federal aos artífices do mensalão, o crime parece que realmente compensa.
Não me considero um pessimista, mas não posso enxergar o momento atual com olhos do “Doutor Panglossão”, personagem que já citei em outros discursos aqui nessa tribuna. Perdoem-me aqueles que acreditam que estamos vivendo num “País das Maravilhas” da propaganda governamental. O cenário atual está mais para um filme de terror, daquele no qual o monstro mata todos os mocinhos. E o filme ganha uma, duas, três sequências.

O cenário é de crise econômica sem precedentes. Por uma margem apertada, devo afirmar que a maioria dos eleitores votou olhando para trás, para antes do mandato da atual Presidente da República. Este Governo que aí está, da Presidente Dilma Rousseff, não tem condições de implantar as mudanças que o Brasil precisa.

Não adianta inventar o slogan “Governo novo, ideias novas”, quando a prática adotada durante toda a campanha eleitoral deste ano demonstra que os métodos continuam os mesmos.
O que fizeram com a maior estatal do Brasil, a Petrobras? Um dos maiores escândalos do Mundo. Desvios que chegaram à cifras bilionárias. É um crime de lesa-pátria. Vai demorar anos para a empresa retomar a tranquilidade necessária para enfrentar os desafios que não são apenas dela, mas que envolvem o nosso próprio futuro como Nação.

Mesmo na oposição, nunca me comportei pela máxima do “quanto pior, melhor”. Tenho responsabilidades para com Pernambuco e para com o Brasil. Mas me nego a concordar com essa flexibilidade ética que o PT busca implantar no Brasil, de que o mesmo erro pode ser repetido pela enésima vez, sem consequência alguma.
Senhor Presidente,

A menos de dois meses do término do meu mandato como Senador da República, quero aqui transcrever um trecho da minha fala de estreia, representando Pernambuco, pronunciado no dia 1º de Março de 2007, no qual abordei, entre outras questões, o tema das reformas institucionais. É um trecho longo, mas que mostra o quanto não avançamos, nesse período, em assuntos tão fundamentais para o aprofundamento da nossa ainda jovem democracia.

Abre aspas:
“O primeiro item desse passivo institucional é a Reforma Política, que consideramos a mãe de todas as reformas”.
Durante a campanha eleitoral do ano passado, sempre que tratávamos do tema, sabíamos que o eleitor mais simples, morador do Sertão de Pernambuco e da periferia do Grande Recife, talvez não compreendesse a prioridade para o assunto.
Por que diante de tantas questões mais prementes, em especial num País de carências diversas como o nosso, colocamos a Reforma Política acima das demais?
Talvez diante do desgaste enfrentado pelo Poder Legislativo, o eleitor compreendesse melhor a Reforma Política, sabendo que com ela pretendemos cortar na própria carne.
Esta é uma maneira de enxergar a questão. Mas não é a única.
Proclamamos a República, presidentes foram depostos, reconstruímos a Democracia mais de uma vez, porém, a relação entre os Poderes permanece semelhante aos últimos anos do Império: o Legislativo quase que completamente submisso ao Poder Executivo.
Diante desta realidade, precisamos implantar mudanças que fortaleçam os partidos, ampliem a interação com a sociedade, tornando a atividade política mais transparente. Um conjunto de medidas que leve a uma Reforma do Comportamento Político.

Entre as medidas que consideramos prioritárias, estão:
- A adoção da fidelidade partidária
- O financiamento público das campanhas eleitorais;
- O fim das coligações proporcionais;
- A implantação do voto distrital misto com listas fechadas;
- A manutenção do segundo turno apenas para as eleições presidenciais.
- O fim das emendas individuais ao Orçamento Geral da União.
Devo ainda citar a Proposta de Emenda Constitucional apresentada pelo nobre Senador Marco Maciel, que tivemos a honra de relatar na Comissão de Constituição e Justiça, restabelecendo a Cláusula de Desempenho, mais conhecida como Cláusula de Barreira. Trata-se de mais um passo importante para fortalecer os partidos, dificultando a proliferação das chamadas “legendas de aluguel”.

Após tanto tempo, permanecem válidas as premissas que abordei naquele início de março, há quase oito anos. Com imensos agravantes, vale ressaltar, diante da inércia do Congresso Nacional em aprovar uma Reforma Política de verdade e não de “faz-de-conta”.
De 2006 para cá, o Brasil viu saltar de 21 para 28 o número de partidos com representação na Câmara dos Deputados. Imaginar que, nas eleições de 1998, a Câmara contava com 18 partidos! E já se achava demais. Não tenho como crer que essa extrema fragmentação partidária represente um avanço. É um retrocesso.

Senhoras Senadoras e Senhores Senadores,
A Presidente reeleita, a Senhora Dilma Rousseff, repete 2010 e promete a Reforma Política como sua prioridade número um. Ouvi isso também do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 e em 2006. Compromissos que não se tornaram realidade. Permaneceram no terreno das promessas não cumpridas, como tantas outras.
Porém, a palavra mágica agora é “plebiscito”, indicando claramente que o PT pretende implantar o modelo “bolivariano”, já em funcionamento em países como Venezuela, Equador e Bolívia.
Esse modelo, Senhor Presidente, começa justamente tentando esvaziar o poder da democracia representativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e, paralelamente, busca coibir a liberdade da Imprensa. As comemorações pela vitória apertada da Presidente da República foram marcadas por ataques aos meios de comunicação, um setor que ainda resiste, felizmente, ao “modo petista” de governar.

Não vou fazer como o PT que evita reconhecer as conquistas dos governantes que o precederam na Presidência da República. É fato que o Governo Lula trouxe avanços na distribuição de renda, mas isso só foi possível porque ele encontrou a casa arrumada, com a moeda estabilizada, o sistema financeiro organizado e a Lei de Responsabilidade Fiscal pondo regras claras para a gestão dos recursos públicos. Mas também é fato que o Brasil de dezembro de 2014 é pior do que o Brasil de dezembro de 2010.

Fazer essa constatação não é ir contra o resultado das urnas. Mais de 51 milhões de brasileiros pensaram dessa forma ao votar na candidatura do Senador Aécio Neves. Na Democracia é assim que deve funcionar: quem ganha vai trabalhar para cumprir o que prometeu, e quem perde vai para a oposição cobrar as promessas feitas e mostrar que era possível fazer diferente.
É isso que pretendo fazer na Câmara dos Deputados a partir do dia 1º de fevereiro de 2015, Casa para qual fui eleito com os votos de mais de 227 mil conterrâneos.

Senhoras Senadoras e Senhores Senadores,
Chego ao término deste mandato de Senador com a sensação do dever cumprido. Tenho a firme convicção de que me dediquei com afinco e determinação ao exercício dessa representação parlamentar.
Em nenhum momento, me descuidei dos assuntos relativos ao meu Estado e à minha Região, que, apesar dos avanços dos últimos anos, ainda permanecem com indicadores econômicos e sociais muito aquém das médias nacionais.
Se a gente for para a ponta do lápis, descobrirá que, a partir de tudo que o Governo afirma, o Nordeste continua recebendo menos recursos do que deveria. Só essa inversão fará a nossa Região elevar seus níveis de desenvolvimento.
O Nordeste já ofereceu muito ao Brasil, ao longo de sua História. Durante séculos, foi a exploração das riquezas do Nordeste que financiou não apenas a Coroa Portuguesa, mas também a expansão das fronteiras deste País de dimensões continentais.
Está mais do que na hora de os nordestinos e as nordestinas receberem a sua contrapartida. Não se trata de favor algum. É apenas a Justiça sendo exercida.
Não é com preconceito, com agressões gratuitas de alguns segmentos retrógados que vamos superar nossas carências crônicas. Como nordestino, como Ex-Prefeito do Recife e Ex-Governador de Pernambuco, me sinto legitimado em acreditar que a miséria “que parou de ser reduzida” só terá o seu fim com a oferta de uma Educação Pública de qualidade.
Precisamos também de uma infraestrutura moderna, com Saneamento, Abastecimento Água, estradas, rodovias e portos. Necessitamos de tudo isso, pautados na lógica de uma política de desenvolvimento regional que mude a realidade das pessoas mais humildes, com Educação, Saúde e emprego qualificados.

Tenho a certeza de que ainda verei o fim do terrorismo em torno do Programa Bolsa Família, utilizado de forma criminosa pelo PT em três eleições presidenciais seguidas, em 2006, 2010 e agora em 2014. Assistimos a um processo de intimidação das pessoas mais humildes, que dependem da ajuda governamental e que não têm acesso adequado à informação honesta e legítima. Mas essa prática perversa terá um ponto final em breve.

Senhoras Senadoras e Senhores Senadores,
Todas as propostas que apresentei nestes quase oito anos tiveram o objetivo de aperfeiçoar os instrumentos disponíveis na nossa ainda jovem democracia.
É o caso, por exemplo, da Proposta de Emenda à Constituição – 18/2013, que torna automática a perda do mandato de parlamentar nas hipóteses de improbidade administrativa ou de condenação por crime contra a Administração Pública, por meio do Supremo Tribunal Federal. A PEC 18 foi aprovada por esta Casa com apenas um voto contrário. Infelizmente, a Câmara dos Deputados não deu a devida atenção ao assunto e, até hoje, não foi encaminhada para votação no Plenário.
Tenho também a consciência dos obstáculos que enfrentei, do elevado preço que paguei pelo fato de ser dissidente do meu partido, de não comungar das ideias defendidas pelo PT.
Porém, não guardo mágoa. Não abriria mão de minhas convicções para estar em sintonia com a prática do “é dando que se recebe”, de uma prática que resultou na série de escândalos de corrupção, nos últimos doze anos, do Mensalão a esse mais recente, que destrói a Petrobras.

Senhor Presidente,
Aqui, no Senado Federal, fiz algumas novas amizades e fortaleci outras já existentes.
Esta Casa, apesar das dificuldades, conta com alguns dos melhores quadros públicos do Brasil, Senadoras e Senadores. São quadros políticos que contribuíram e ainda vão contribuir muito para construir um País mais justo socialmente; um País onde as pessoas que mais precisam tenham acesso a serviços públicos de qualidade, tão bons ou até melhores do que aqueles oferecidos pelo setor privado. Este é o Brasil com o qual eu sonho desde que entrei na vida pública.
É na defesa dessas mesmas bandeiras que estarei na Câmara dos Deputados na tribuna que já tive a honra de ocupar, entre 1975 e 1978 e entre 1983 e 1985. Aqueles foram dois momentos distintos. Ambos de uma imensa riqueza de debates, de embates, na luta para encerrar o período autoritário e restabelecer a democracia.

Volto à Câmara dos Deputados, trinta anos depois, em circunstâncias diferentes, mas tão desafiadoras quanto nas décadas de 1970 e 1980. Nossa luta agora é para impedir que o Brasil perca as conquistas dos últimos 30 anos.
Estarei na defesa da estabilidade econômica, pressuposto fundamental para combater a miséria e tirar da pobreza os milhões de brasileiros e brasileiras que ainda estão de fora do processo produtivo.
O Poder Legislativo precisa estar consciente do seu papel. Não é razoável aceitar que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal fiquem sempre com a pauta negativa quando explode alguma crise. Isso só é possível quando Deputados e Senadores, mesmo aqueles que integram a base governista, assumem uma postura de independência institucional; quando colocam os interesses do Brasil acima da vontade do mandatário de plantão.

Meus compromissos são os mesmos que apresentei no meu primeiro discurso, aqui nesta tribuna, em 1º de março de 2007: precisamos implantar mudanças que fortaleçam os partidos, ampliem a interação com a sociedade, tornando a atividade política mais transparente. Um conjunto de medidas que leve a uma reforma do comportamento político.

Como Deputado Federal representando o Povo de Pernambuco, não me calarei diante das tentativas de esvaziar a força da democracia representativa; não ficarei omisso quando tentarem calar a Imprensa; não fugirei do embate para impedir o controle hegemônico das instituições democráticas.
Era o que tinha a dizer.

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