Por Ricardo Noblat
1
Em fevereiro de 1985, Leitão de Abreu, chefe da Casa Civil do último
general-presidente da ditadura de 64, avisou ao presidente eleito
Tancredo Neves que Délio Jardim de Matos, ministro da Aeronáutica,
estava furioso. Dizia que Tancredo se comprometera a não escolher para
sucedê-lo seus desafetos Moreira Lima e Dioclecio Lima. Mas que estava
prestes a fazê-lo. Corria contra isso um manifesto de brigadeiros.
Tancredo telefonou para Aureliano Chaves, que apoiara sua eleição: “Você
tem cinco minutos para dizer quem será o ministro da Aeronáutica:
Moreira ou Dioclecio”. Aureliano preferiu Moreira. Tancredo telefonou
para seu Secretário de Imprensa e orientou-o a anunciar o nome de
Moreira. Francisco Dornelles, sobrinho de Tancredo, que a tudo assistiu,
comentou: “Mas, o senhor fez o contrário do que o Leitão disse”.
Tancredo: “Se existir um manifesto, quem assinou ainda terá tempo de
retirar a assinatura. E quem não assinou não assinará mais”. Tancredo
pediu a Dornelles: “Procure o Leitão. Diga que foi Aureliano quem
indicou Moreira. E que a essa altura eu não pude fazer mais nada”. Não
houve manifesto.
2
Ao saber que Alfredo Karan, ministro da Marinha, conspirava contra
sua candidatura a presidente, Tancredo convidou-o para continuar no
cargo. Karan aceitou radiante. Às vésperas de tomar posse, Tancredo
explicou-se a um amigo: “Karan tentou me dar um golpe e eu dei um golpe
nele. Não será ministro”.
3
Um dia, Tancredo recebeu um recado do deputado Gustavo Farias
(PMDB-RJ): “Paulo Maluf me oferece 100 mil dólares para eu votar nele. E
o senhor?” Tancredo: “Só prometo que não mandarei atrás de você nem a
Polícia Federal nem a Receita”. Ganhou o voto de Gustavo.
4
Houve momentos difíceis na campanha de Tancredo para presidente. Num
deles, reunido com auxiliares, as reclamações foram muitas. Um disse: “O
senhor abandonou Minas.” Outro: “O comitê do Maluf tem mais
computadores do que o nosso”. Um terceiro: “Maluf fala olhando para a
câmera de televisão e o senhor não”. Tancredo perdeu a paciência: “Se
Maluf é tão melhor por que vocês não vão apoiá-lo?” Ninguém foi.
5
Eleito governador de Minas em 1982, Tancredo ouviu do seu Secretário
de Planejamento, Ronaldo Costa Couto: “Para pôr ordem nas contas teremos
de demitir 10 mil funcionários”. Tancredo: “Posso contratar mil?”
Surpreso, Ronaldo respondeu que sim. No dia seguinte, a manchete do
principal jornal de Minas foi a notícia da contratação. A fonte dela:
Tancredo. Que se justificou: “Mineiro só gosta de admissão”. O jornal
não noticiou as demissões.
6
Governador, Tancredo telefonou para Dornelles. Quando a secretária de
Dornelles passou a ligação, Tancredo já estava na linha. Dornelles:
“Mas o senhor está aí? Pensei que fosse a secretária”. Tancredo: “Só
cheguei a governador porque sempre entrei na linha na frente dos
outros”.
7
A um amigo que o viu esperar mais de uma hora para ser atendido por
um burocrata do Ministério da Fazenda, Tancredo, ainda deputado federal,
ensinou: “Ele me humilha, mas libera minhas verbas. Ministro não manda
em ministério. Quem manda é o segundo escalão”.
8
Crisanto Muniz, deputado do PSD, queixou-se a Tancredo: “Somos
amigos, mas você dá mais atenção ao Ernane Maia” (deputado do PTB).
Tancredo: “Faço isso por um só motivo: ele é doido. E doido tem que ser
tratado com muito carinho”.
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