Entre os livros que devorei no Carnaval, o que mais me impressionou foi o de Rosane Malta, a ex-primeira-dama do País, que assinava por Rosane Collor, ex-mulher do ex-presidente Collor. Não há revelações bombásticas que já não tenham sido especuladas pela mídia, mas o testemunho de Rosane, feito de forma muito seguro, impressiona pela sua coragem.
Separada de Collor, Rosane move um processo de pagamento de pensão e de tudo que tinha direito ao longo dos 22 anos em que foi casada. Seu livro é um mergulho profundo na era Collor, que nunca mais será esquecida. A era em que se cassou um presidente da República logo após o período de redemocratização.
Rosane foi cortejada por Collor quando ainda usava uniforme escolar, aos 15 anos, em Canapi, interior de Alagoas, terra governada pela sua família Malta. Da pequena Canapi para o cenário nacional, levada pelo namorado e depois esposo, Rosane acompanhou crises de depressão e medo de suicídio do marido, além de humilhações públicas.
“Tudo o que vi e vivi” (R$ 39,90, editora LeYa) é a versão de Rosane Malta (agora com o nome de divorciada) sobre a sua relação com o ex-presidente apeado do poder. “Tudo o que digo no livro é verdade”, diz a ex-primeira-dama.
No livro, com 222 páginas, numa linguagem direta, Rosane revela que, mesmo vivenciando a conturbada rotina de primeira-dama, com muitas brigas conjugais, subiu a rampa do Palácio do Planalto após o impeachment, apertou a mão de Collor, e disse: “Levante a cabeça. Não abaixe, não. Seja forte”.
Em seu depoimento, Rosane confessa que Collor é o maior amor e a maior decepção de sua vida. Relata intrigas familiares, os rituais macabros que eram realizados na Casa da Dinda, os esquemas e a morte do ex-tesoureiro de campanha de Collor, Farias, o PC, Paulo Cesar, além do destino do dinheiro do esquema de corrupção.
No tempo em que ficou na Presidência da República, ela conta que Collor usava a Casa da Dinda para rituais que pudessem fortalecê-lo politicamente. O relato mais forte sobre as sessões realizadas pela Mãe Cecília, de confiança do ex-marido, envolveu fetos humanos.
“Cecília me contou que, certa vez, fez um trabalho para Fernando envolvendo fetos humanos. Ela pegou filhas de santo grávidas, fez com que abortassem e sacrificou os fetos para dar às entidades. Uma coisa terrível, da qual ela obviamente se arrepende. Quando eu soube disso, chorei copiosamente”, conta ele, no livro.
Um dos primeiros “trabalhos” dos quais Rosane teve notícia ocorreu quando Collor ficou enfurecido com a decisão de Silvio Santos de se candidatar à Presidência em 1989. E ainda mais com o apoio de José Sarney, seu inimigo político. O dono do SBT havia dito a Collor que não concorreria ao cargo, mas descumpriu o acordo. O candidato do PRN, então, encomendou um “trabalho”. Pouco depois, a candidatura de Silvio foi impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral.
“O grande problema de Fernando era com Pedro. E o meu, com Thereza, a mulher dele”, revela Rosane, ao falar sobre o irmão de Collor, Pedro Collor, que provocou a queda do ex-presidente a partir de uma entrevista reveladora à revista Veja. Rosane afirma que o irmão caçula do ex-marido tinha ódio do ex-presidente. Segundo ela, Pedro sustentava que Fernando cantava Thereza.
“Acredito na tese de que os dois tiveram algo antes do meu casamento e Thereza continuou apaixonada. Eu também não duvido que tenha sido por Thereza, por essa obsessão que ela tinha pelo cunhado, que Pedro resolveu destruir o próprio irmão”, diz ela.
No período mais agitado da República desde a redemocratização, ela diz que não tinha dúvidas de que Collor era inocente. “Eu era muito nova, pouco experiente e acreditava no meu marido. Eu achava normal que as pessoas ajudassem Fernando espontaneamente, como fazia PC Farias”. Depois, no entanto, mudou de opinião e relatou que “algumas dúvidas foram surgindo”.
Rosane descreve o deslumbramento da jovem que desfrutou o poder: a dedicação ao figurino e as palavras elogiosas que trocou com a princesa Diana, além da amizade com Cláudia Raia e outras pessoas famosas. Conta que foi elogiada por Fidel Castro:
“Esse presidente do Brasil é muito esperto. Arrumou uma esposa novinha e linda” teria dito o ditador cubano a Collor. Segundo Rosane, mesmo após o impeachment, Fidel continuou a enviar charutos da ilha caribenha ao ex-presidente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário