Folha de S.Paulo
A votação que decidiu manter Dilma Rousseff apta para ocupar funcções públicas resultou de uma articulação capitaneada pelo PT e pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O Senado cassou o mandato de Dilma, poe 61 a 20, mas evitou que a petista ficasse proibida de exercer funções públicas –foram apenas 42 votos para que isso ocorresse, 12 a menos do que o mínimo necessário.
A manobra regimental de última hora envolveu também o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Ricardo Lewandowski, e irritou integrantes da base do novo governo, causando desgaste e troca de acusações na base aliada de Michel Temer.
DEM e PSDB ameaçaram questionar o Supremo sobre o episódio, mas recuaram sob a avaliação de que isso abriria brecha para que todo o processo fosse questionado.
Renan votou a favor do impeachment, pondo fim ao mistério se continuaria neutro ou não em relação ao processo. Por outro lado, agiu nos bastidores para dar uma "recompensa" à Dilma.
Sob respaldo de Renan, Lewandowski acatou pedido da defesa de Dilma para que fossem feitas duas votações para selar o destino da petista.
A primeira, sobre a cassação do mandato, que selou a saída da petista. E uma segunda, para decidir se, condenada, ela ficaria inabilitada para ocupar cargos públicos pelos próximos oito anos.
A decisão de Lewandowski, porém, causou confusão no plenário. Hoje senador, o ex-presidente Fernando Collor de Mello (PTC-AL), condenado em impeachment em 1992, reclamou do tratamento diferenciado.
Do microfone, disse que, em 1992, chegou a renunciar para evitar o julgamento do Senado e a consequente inabilitação para cargos públicos, mas, ainda assim, a Casa decidiu concluir o processo para lhe aplicar a pena.
A oposição ao PT argumentou o mesmo e sustentou que, constitucionalmente, as duas sanções seriam indissociáveis, mas Lewandowski não cedeu.
Apesar da decisão, ainda não ficou claro se a agora ex-presidente poderá disputar cargos eletivos. A permissão para ela concorrer às eleições deve ser objeto de questionamento judicial em caso de registro de candidatura.
'QUEDA E COICE'
Na noite anterior, Renan se reuniu com petistas e questionou se dariam apoio à iniciativa de colocar em votação projetos de interesse do governo e do Judiciário em troca da ajuda para não impedir Dilma de ocupar cargos públicos.
Petistas ouvidos pela Folha antes do início da sessão disseram não ter havido acordo.
"No Nordeste, costumam dizer uma coisa: 'Além da queda, coice'. Não podemos deixar de julgar, mas não podemos ser maus, desumanos", discursou Renan.
Aliados de Dilma também fizeram apelos. A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) chegou a dizer que a petista se aposentaria com "R$ 5.000" pelos cálculos que faz hoje e que, portanto, precisava trabalhar para sobreviver.
Lewandowski se somou aos apelos: "[A pena] Inabilita o condenado ao exercício de qualquer função pública. De professor, de servidor de prefeitura, enfim, até de merendeira de um grupo escolar", disse. Logo em seguida, afirmou que, com sua posição, não queria "induzir" os votos dos parlamentares.
Dilma conseguiu escapar da inabilitação com o apoio de Renan e outros quatro peemedebistas, além do líder do partido no Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) e Valdir Raupp (PMDB-RR) que se abstiveram.
A dissidência dos peemedebistas irritou o Planalto. Logo após a votação, Temer disparou sinais de que não sabia da articulação de Renan e de que era contra a interpretação dada por Lewandowski.
O líder do PSDB, Cássio Cunha Lima (PB), disse que seu partido fora traído.
O julgamento final de Dilma durou sete dias, em um total de 73 horas e 44 minutos. O país conheceu o resultado da votação da cassação às 13h36.
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