quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

A escolha errada


Esta era a hora de indicar pessoa sobre a qual não pairasse dúvida
Míriam Leitão - O Globo
Alexandre de Moraes é membro do PSDB, fez sua carreira no partido e virou ministro do governo Temer. Até aí, parece o retrato no espelho do ministro Dias Toffoli.
Esse é que é o problema.
Toffoli foi advogado do PT em campanhas presidenciais e, mesmo assim, no julgamento do mensalão, que tratava de corrupção do PT em campanhas eleitorais, não achou que houvesse impedimento em julgar aqueles que defendera.
Moraes disse ontem que se declarará impedido de julgar tucanos. Menos mal.
O presidente Michel Temer também não está sendo sutil quando escolhe seu ministro da Justiça para assumir a vaga de Teori Zavascki, após ter sido pessoalmente citado nas delações premiadas e ter seus ministros citados na Operação. Quer garantir pelo menos um voto a seu favor, e, já que Toffoli abriu o precedente, ele também poderá dizer que não vê impedimento.
Se o STF se calou daquela vez, diante do óbvio conflito de interesses entre Toffoli e o julgamento do mensalão, o que poderá dizer agora?
O que é um voto?
Pode ser o de desempate numa Corte dividida em questões cruciais como, por exemplo, o momento que recai sobre o réu o cumprimento da pena. Felizmente, ele não será o ministro relator da Lava-Jato, mas seria mesmo um acinte acima do tolerável.
Toffoli e Moraes têm outro ponto em comum: com 49 anos, vão influenciar a vida dos brasileiros, em todos os campos e com todo o poder que tem o Supremo, por mais 26 anos.
É natural a escolha de uma pessoa com quem o presidente ou seu grupo no poder têm mais afinidade. Mas teria que ser uma identidade mais sutil e não tão explícita quanto a do ministro Alexandre de Moraes.
Pode-se argumentar que o ministro Edson Fachin foi acusado de partidarismo antes de assumir, mas se portou como um magistrado. Não há garantia de que isso se repita.
O Brasil viu outros momentos em que ministros do STF exibiram sua lealdade aos grupos que o indicaram.
O ministro Ricardo Lewandowski não escondeu, ao longo do julgamento do mensalão, que tinha um lado. Começou combatendo a estratégia de apresentação do voto do então ministro Joaquim Barbosa e não parou mais durante todo o julgamento.
No comando do impeachment no Congresso, tomou decisões impressionantes: considerou que o procurador de contas junto ao TCU era suspeito e portanto não poderia ser testemunha. E julgou que o ex-ministro do governo Dilma, autor de uma das pedaladas, Nelson Barbosa, era isento o bastante para ser testemunha.
E no final conseguiu a proeza de preservar os direitos políticos da presidente condenada por crime de responsabilidade.
Esses casos mostram que a escolha para ministro do STF pode ter um peso enorme em futuras decisões do país.
O poder que a pessoa passa a ter, com a toga, é grande demais, longo demais, incontestável demais. Por isso é que ele mesmo, Moraes, considerou, na sua obra, que quem exerceu cargo de confiança num governo não pode ser indicado por ele.
No episódio de sua declaração em Ribeirão Preto, ficou a impressão de que ele sabia da operação que prenderia o adversário político Antonio Palocci. Ele estava em evento de campanha do candidato do PSDB e fez essa inconfidência.
Dias depois, Palocci foi preso e estourou uma crise na Polícia Federal, que garantiu guardar até do ministro o segredo, informando- o apenas em cima da operação.
Como ministro da Justiça, ele não podia ter falado o que falou.
Suas declarações atrapalhadas são muitas, suas controvérsias, também, como a de ter sido advogado de Eduardo Cunha num processo em que o expresidente da Câmara foi acusado de ter usado documento falso.
Mas o mais importante não é nada pessoal, nem sutil. Integrantes deste governo, inclusive o presidente, foram citados na Lava-Jato, que o STF passa a julgar.
Esta era a hora de indicar pessoa sobre a qual não pairasse essa dúvida.

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