No momento em que o Mercosul comemora 20 anos e, infelizmente, convive com crises diárias no comércio Brasil-Argentina, é obrigatória uma profunda reflexão sobre a integração entre os quatro países.
O Estado de S.Paulo: Paulo Nicola Venturelli, Pedro de Camargo Neto e Renato Henz
O fortalecimento do Mercosul teria importante efeito positivo para a região, ampliando sua inserção nos fluxos do comércio mundial, principalmente como provedor imbatível de cereais, oleaginosas e proteína animal. Por outro lado, o bloco se apresenta como demandante no mercado de insumos e de investimento em infraestrutura, tendo em vista a movimentação dessa produção e de seus insumos e equipamentos, cuja fabricação se encontra distribuída pelo subcontinente.
Na eventualidade de uma rejeição a este processo de aprofundamento por parte de algum de seus membros, seria preciso avaliar alternativas. O que se deseja, porém, é o sucesso deste processo.
O Mercosul precisa avançar com novos acordos de livre comércio, em primeiro lugar com os demais países da América do Sul. Estes são importantes mercados para nossos produtos manufaturados. Estamos sofrendo pressões concorrenciais e desvios dos fluxos de comércio para a China ou mesmo para o México, país que tem acordos de livre comércio com quase todos os países da região. Os EUA também têm acordos de livre comércio com o Chile e o Peru. Em futuro próximo, existe a perspectiva de a União Europeia, que já tem tratado de livre comércio com o Chile, concluir acordos que já vem negociando com o Peru e a Colômbia. O Mercosul não pode ficar parado.
Considerando que qualquer negociação a ser empreendida pelo Brasil deve ser feita de forma conjunta como Mercosul, deve-se ter em conta as dificuldades que esse fato impõe a qualquer avanço em futuras negociações comerciais.
O aprofundamento exigirá, entre outras medidas, a revisão e a eliminação das exceções à Tarifa Externa Comum para se chegar à livre circulação de bens e serviços.
No Brasil, vários setores da indústria exercem pressão para serem excluídos de acordos comerciais. Na Argentina, vive-se uma volta a um passado mítico, com a reintrodução de prática do tipo populista. No vizinho, a política macroeconômica é consubstanciada em forte transferência de renda, via impostos à exportação, do setor rural e da agroindústria para os setores urbanos. E a reativação de programas de substituição de importações, inclusive, viola regras do Mercosul.
O Paraguai e o Uruguai têm pautas de exportação concentradas em poucos produtos agrícolas e em um ou outro produto manufaturado.
O aprofundamento ou, melhor dizendo, o resgate das origens do Mercosul exige profunda e forte liderança do Brasil, que, acreditamos, teria força econômica e política suficiente para mudar o atual comportamento dos vizinhos nesta questão, uma vez que todos os países necessitam de capitais e de um mercado externo dinâmico, em particular para produtos agroindustriais, para dar continuidade ao seu desenvolvimento.
O mais importante, no entanto, é o Brasil mudar sua atitude e, nessa mudança, fazer com que a Argentina o acompanhe.
As dificuldades políticas nas negociações impostas por setores que não desejam ser incluídos nos acordos buscados pelo Mercosul poderiam ser resolvidas de uma maneira direta e clara. Por um lado, não se aceitaria a exclusão de qualquer setor econômico das negociações, sob qualquer alegação. Em troca, se assumiria o compromisso de que, em todos os acordos, haveria cláusulas de salvaguardas.
O Mercosul, como parte de um projeto político latino-americano, não pode bloquear ou ser justificativa de bloqueio aos necessários avanços no processo de integração global em seus aspectos econômicos e comerciais.
RESPECTIVAMENTE, ECONOMISTA, EX-COORDENADOR DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO (MAPA); PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA PRODUTORA E EXPORTADORA DE CARNE SUÍNA (ABIPECS); E ECONOMISTA DA SECRETARIA DE POLÍTICA AGRÍCOLA DO MAPA
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