domingo, 12 de junho de 2016

Depois dos vazamentos


Jânio de Freitas - Folha de S.Paulo
As considerações do procurador-geral Rodrigo Janot, em resposta às feitas sobre seu pedido de prisão de José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá, foram exaltadas (com certa razão), mas sem o essencial. Sua indignação com insinuações de planos eleitorais e com a atribuição do vazamento à própria Procuradoria da República –sugestão que envolve o ministro Gilmar Mendes– leva-o ao propósito de identificar as respectivas origens. O que muitos consideram já vir tarde. E, a ser feito mesmo, deve começar por reconhecer o direito dos jornalistas (os profissionais, que são os jornalistas de fato) ao sigilo sobre suas fontes de informação. Lembrança necessária em tempos de arbitrariedades judiciais.
Em artigo anterior, ficou aqui a estranheza com o pedido de Janot em razão de conversas que não formalizaram a alegada obstrução à Justiça, em particular à Lava Jato. Nas gravações traiçoeiras de Sérgio Machado, quem vai mais longe é Romero Jucá, e ainda assim não passa da proposta de um pacto incluindo o Supremo Tribunal Federal para interromper a Lava Jato.
Há outro e mais forte motivo para a possibilidade de causa tática, emocional ou política no ato de Janot. O Supremo tornou bem definidas, e reiteradas muitas vezes, as funções admitidas nos dois tipos de gravações. As que receberam autorização judicial podem ter validade judicial plena, para acusação e para defesa. As feitas sem autorização judicial, não importa em que condições e por quem realizadas, têm validade judicial restrita: são admitidas apenas para defesa.
Janot, por juntar no pedido os três atraiçoados por Sérgio Machado, indica o uso das gravações como base para prendê-los por articulação contra a Lava Jato.
Não há dúvida de que Rodrigo Janot conhece a norma assentada pelo Supremo para o uso judicial de gravações. Se a desprezou, apesar da possível previsão de que o Supremo não atenderia o seu pedido, insinua a existência de um propósito subjacente ao que vazou da sua iniciativa. Mas isso o procurador-geral não mencionou nem sugeriu na sua reação exaltada.
Situações semelhantes repetem-se como uma das novas características, acentuadas na Lava Jato, da Procuradoria da República e da Polícia Federal. Trata-se de um descaso irremediável pela opinião pública, que é mobilizada e logo deixada no ar, não só em curiosidade, mas, é o que importa, em diferentes inseguranças. Esse é um dos alimentadores e aceleradores das tensões, dos temores e do desalento que contaminaram o país todo.
Da parte de quem o pratica, é um sinal a mais da presunção de não dever explicações, de desfrutar da liberdade para a todos manipular, de só ter discordantes e críticos de má-fé. É o autoritarismo em nome de moralidade e de justiça. E, desse jeito, um dos ingredientes mais agudos da crise que nem é mais apenas política ou econômica.
O que desagradou a Janot, com razão, não é suficiente para dispensá-lo, já que houve o vazamento parcial, de proporcionar à opinião pública os esclarecimentos convenientes. No mínimo, por dever de servidor público. Também porque, afinal de contas, o vazamento só poderia vir do conjunto de áreas e servidores de que Rodrigo Janot é um dos responsáveis maiores.
Além disso, foi Janot quem divulgou uma advertência lúcida sobre a necessidade de contenção da vaidade e da prepotência nos que lidam com Justiça.

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