segunda-feira, 22 de novembro de 2010

“Não vou negar que sentirei falta”

RENATA BEZERRA DE MELO   
O deputado federal Roberto Magalhães (DEM) entrou na política “para passar quatro anos”. “Para advogar, eu tenho o resto da minha vida”, pensava nos idos de 1970. Acabou levando mais 30 anos até que tomasse a decisão de abandonar de vez a vida pública, o que fará em janeiro de 2011, quando encerra-se seu quarto mandato na Câmara Federal. Daqui para frente, pensa em retomar a advocacia. Mas a prioridade é escrever suas memórias, que já começou “a digitar”. Prestes a virar essa página, recorda a pressão mais negativa sofrida quando, para atender o partido, saiu candidato ao Senado, na chapa de José Múcio e acabou derrotado. Este ano, ao passar por convocação similar, entendeu que os aliados estavam “equivocados”. Estava decidido a não concorrer a mais nada desde 2006, eleição na qual a única coisa que pediu foi “para não perder com humilhação”. À Folha, o democrata fez algumas reflexões antes de dar adeus ao Congresso Nacional.
A desistência foi planejada?
Eu achei que ia ter uma eleição muito difícil (2006). Mas eu disse: não vou deixar de disputar essa eleição, porque eu tenho muita gente que trabalha comigo. Então, disputei eleição sem motivação. Não queria nem abrir comitê. Foi minha mulher que abriu. Comecei fazendo aquelas placas. Mas quem disse que eu conseguia aumentar o número? Denunciavam. “Não pode. Está em cima do borracheiro, borracheiro é comércio”. Trabalho enorme, caro. Cheguei a botar 30 na cidade, que é muito pouco. Quando vi, as dez melhores já tinham sido tiradas pelo Tribunal (Regional Eleitoral). Veja como eu estava certo, eu nunca tive menos de 200 mil votos. Só no Recife, eu tive 106 mil (2002) quando tinha deixado a Prefeitura. E, naquele ano, tive abaixo de 110 mil. Aliás, eu tinha dito a minha mulher: Eu só quero me eleger. Só peço a Deus uma coisa: que não perca com humilhação.
E qual seria essa humilhação?
Não é humilhação ficar na primeira metade. Pois, não é que eu fiquei?! São 25 (vagas) não é? Acho que fiquei em 12º, exatamente como eu queria. Não caí. Aí reuni o pessoal aqui e disse: quero comunicar que não sou mais candidato. Vocês vão ter quatro anos para planejar suas vidas. E não houve um dia que eu tivesse dúvida.
Por que, este ano, lhe propuseram sair candidato ao Senado?
Eles estavam equivocados. Estou na planície há muito tempo. Desde que eu perdi para a Prefeitura do Recife (2000/reeleição), eu só fui deputado minoritário num Congresso dominado inteiramente pelo Planalto.
O senhor disse a eles que os julgava equivocados?
Pedi uma reunião. Fiz uma carta, nunca fui tão competente na minha vida, para Jarbas Vasconcelos e uma para Marco Maciel, inclusive, dizendo que estava diagnosticado um aneurisma na aorta. Agora, todo mundo diz: dr. Roberto é que estava certo, porque ele viu a derrota de Maciel e de Jarbas.
Antevia derrotas nas dimensões em que se deram?
Não. Eu acho que Jarbas e Maciel mereciam muito mais pelo que eles já fizeram por Pernambuco. Jarbas deixou uma obra extraordinária, que foi a BR 232. Ela não é uma obra do Agreste, é uma obra de Pernambuco. Agora, já há um projeto para chegar até Garanhuns. Não poderia perder em todos os municípios que margeiam aquela estrada. Uma coisa que me doeu. Uma coisa é uma derrota feito eu perdi para João Paulo, por menos de um ponto. Primeiro, eu ganhei por 90 mil votos de diferença, e, por menos de um ponto, não cheguei aos 50%. Logo em seguida, fez-se uma pesquisa. Ele disparou e eu caí. Ficamos com 14 pontos de diferença. Nos debates, foram três ou quatro e com a campanha eu recuperei. E entramos empatados no dia da eleição. Ao meio-dia, uma pesquisa de boca de urna do Ibope dava que eu estava ganhando por 1,5 ponto. Às 17h, eu perdia. Perdi por quanto? Uns cinco mil votos. Em seis milhões de pessoas, dá menos de 1%, não é? Então, é uma derrota honrosa. Tanto que na eleição de deputado (2002), sem comprar voto, sem um prefeito, eu tive 106 mil votos no Recife e me elegi com 204 mil votos.
Guarda lembranças da carreata, em Boa Viagem, daquela campanha contra João Paulo (PT)?
Colocaram uma jamanta atravessada. Esperaram que a gente chegasse, e o PT, aquela coisa do PT, começou a dizer impropérios, provocando.
Qual fato mais traumático de sua vida pública?
Foi ter perdido a senatoria (1986). Saí do Governo com 73% de aprovação. Eu tinha o maior ibope do Brasil, com 65% na pesquisa da TV Globo/Gallup e, no dia, eu perdi. Embora tenha uma explicação: Miguel Arraes (PSB) começou a pedir voto para os senadores.
Há segredo guardado dessa trajetória política que, hoje, possa ser contado?
Vou escrever um livro e aí eu vou decidir quais coisas que não contei. Muitas eu não vou poder contar, porque as pessoas estão vivas aí e fica muito ruim você dizer coisas que possam atingir. Não só as vivas. Eu não vou fazer isso.
Já começou?
Não. Estou pensando.
Há algo gravado?
Pouca coisa. Estou digitando...Acho que o melhor é ditar, anda mais ligeiro.
O que lhe foi dito que marcou ou surpreendeu ao longo da vida pública?
Anteontem, citei um. Foi entregue a medalha Nilo Coelho, no Tribunal de Contas do Estado. Então, o Severino Otávio fez o discurso. E disse uma coisa que me sensibilizou e é verdadeira. Falou que, em 21 anos, que ele é conselheiro, Dr. Roberto nunca me pediu nada, nem a favor de seus correligionários, nem contra os seus adversários. Quando ele me entregou a medalha, eu disse: vou fazer uma homenagem, revelando aqui um fato que eu nunca registrei na Imprensa, nem em conversas. Eu governador, nos idos de 1984, reuni a bancada, comuniquei que tinha chegado a decisão, que deveria apoiar Tancredo Neves, embora de partido adversário, para presidente da República. Com isto, estarei cometendo, do ponto de vista partidário, um grave erro, porque estaremos transmitindo o poder ao partido adversário. Mas, ao mesmo tempo, quero dizer que, como pernambucanos e brasileiros, temos o dever de agir dessa forma, porque esta entendo que é uma última oportunidade de nós redemocratizarmos o Brasil pacificamente. Severino Otávio foi o primeiro que se levantou e disse: governador, estou ao seu lado. Não faltarei nem ao Brasil, nem a Pernambuco.
Do que sentirá mais falta?
Eu não vou negar que sentirei falta, porque eu jamais quis ser político. Fui nomeado secretário de Estado, surpreendentemente, num fim de tarde. Me saí bem. E por isso não esqueceram mais de mim. Voltei para advocacia e o magistério universitário. Sete, oito anos depois Marco Maciel (DEM) me convida para ser o vice na sua chapa. Minha mulher ficou angustiada, disse que eu ia jogar fora minha profissão. Eu disse: são só quatro anos. Marco Maciel tem 36 anos, muito jovem. Vai fazer um Governo renovador. Para advogar, eu tenho o resto da minha vida. Mas eu tava enganado, porque fui ser vice e, no final, fui candidato a governador para perder, que era contra Marcos Freire, o mais forte candidato do PMDB do Brasil, e ganhei. Aí não saí mais. Sabe o que é? A pessoa se realiza inteiramente na profissão liberal, empresarial, mas quem passa pela experiência do poder público, em grande parte, não esquece, e tendo oportunidade retorna. Porque, na coisa pública, sobretudo no Poder Executivo, você tem o poder de fazer. Eu vi a população de Salgueiro três anos sem água. Um tonel nas costas, o caminhão vinha, água nem era tratada. Depois, se botava umas pastilhas de cloro. Resolvi fazer a chamada Adutora do Sertão, que era 70 quilômetros. De Cabrobó, levando água do São Francisco até Salgueiro. Fiz mais. Em vez de 70, fiz 172 km. Antes de Salgueiro, fiz um braço para levar para o município de Parnamirim, Terra Nova, distrito de Salgueiro, que é o Mães, Verdejante, Serrita. Já pensou? Até hoje está lá dando água.
Vicia...
Agora, às vezes, eu me pergunto: por que é que eu me saio tão bem nos cargos e perco as eleições depois? É simples. Eu tenho tanta paixão pela obra que não faço política.
Há arrependimentos?
Ora, quem é que não erra?
O senhor deixou transparecer que se cobra muito.
Quer ver um erro que eu cometi? Eu, quando era governador, queria ir até o fim do mandato, porque era tradição dos governadores pernambucanos ficar até o fim. E o partido em cima de mim, em cima de mim. ‘Sem você, José Múcio não se elege, enfraquece a chapa’. E eu, para atender o partido, fui ser candidato (a senador). Perdi.
Qual foi a maior pressão que já sofreu?
Deve ter sido essa, porque foi a mais negativa para mim.
Recentemente, convidado para candidatar-se ao Senado na chapa de Jarbas, o senhor já estava escolado...
Agora eu digo, como Cristo (risos), ‘tu dizes’. Você é que está dizendo. Mas não tinha condições. Um aneurisma, se estourar, você morre.
Atribui a derrota da oposição no Estado ao poder de Lula?
Há casos em que líderes conseguem dominar uma população. Sem querer comparar Lula a Hitler. Mas, eu queria dizer: Hitler dominou o povo alemão, ao ponto que fez uma guerra e destruiu, principalmente, a Alemanha. Como se admite que Hitler tenha levado a Alemanha à desgraça e aquele povo não tenha reagido? Houve duas tentativas de assassinato totalmente frustradas. Outro que dominou a Itália foi Mussolini. Tem Stalin, se bem que Stalin foi pela força, mas transformou-se numa figura importantíssima. Ainda hoje tem stalinista por aí. O próprio Niemayer disse: continuo comunista e stalinista. O caso Lula deverá ser estudado não só politicamente, mas também do ponto de vista da psicologia social, porque ele conseguiu se dissociar do PT, sobretudo, depois do mensalão. É como se Lula e PT não tivessem nada a ver e o PT foi feito à imagem e semelhança de Lula que foi seu fundador. Ontem, vi um programa onde se discutia porque Lula tem 80% de aprovação e seu Governo 50%. Porque ele se dissociou.
Daqui para frente, quais são os planos na área política?
Já aprendi que nós não podemos ultrapassar os fatos. Eu não tenho, hoje, dados, fatos que me autorizem a tomar um rumo.
Está dependendo de como a oposição se organizará?
O PMDB aqui em Pernambuco é sui generis, né? É nosso aliado, mas é liderado por Jarbas. Eu não sei se amanhã a direção nacional intervém aqui e acaba com tudo.
Há comentários de que, ainda durante a campanha, planejava-se passar o comando para Edgar Moury (deputado federal não reeleito/PMDB).
Jarbas é um político muito competente. Eu acho que ele saberá traçar seu caminho.
O que vê de perspectivas para oposição em Pernambuco?
Temos que nos preparar para não ter candidato para perder, preparar prefeitura e tudo, porque política se faz agregando e com muita inteligência, estratégias corretas para ter candidatos viáveis para disputar prefeitura e Governo. Pode parecer impossível a alguns. Eu digo que nada é impossível em Política, vai depender da nossa capacidade de congregar partidos e lideranças.
Pensa em ajudar a oposição a traçar rumos para 2012?
Sim, se ela agir sem personalismo, voltada apenas para o interesse da vitória das oposições.
Foi a decisão acertada interromper a carreira política agora?
Na Bíblia diz que há tempo para tudo. E eu diria que os políticos também devem saber a oportunidade de entrar e o momento de sair. Qual foi meu ápice? Comecei procurador, assessor jurídico de governador, secretário de Estado, vice-governador. Governador foi o ápice, e tive ainda meus dois primeiros mandatos de deputado, que foram muito bons, porque eu não era oposição. Ser deputado com Lula e também com Dilma, na oposição, você não recebe projetos importantes para relatar. Até nas comissões, você é discriminado, coisa que nunca houve no Congresso Nacional. Os projetos mais importantes, que eu relatei foram fruto de pessoas ou entidades que pediram ao presidente que distribuísse a mim, Roberto Magalhães, porque tudo importante eram o PT e PMDB que escolhiam os presidentes.
Reclama da partidarização?
No caso, a partidarização das comissões, que era uma coisa tênue no passado, passou a ser regra geral. Então, já no final da primeira legislatura, de 2003 a 2006, comecei a cogitar encerrar atividade de deputado. Você não se sente bem naquele ambiente. Nós (oposição) éramos 100, Lula tinha 400 deputados. Aí, a oposição fazia uma coisa que eu não gosto de fazer, só excepcionalmente: obstrução. Aliás, em relação à Comissão de Justiça, tenho duas ressalvas importantes. Houve dois presidentes do PT que não discriminaram, que eu considerava amigos. Primeiro, o Antônio Carlos Biscaia, que foi procurador de Justiça do Rio de Janeiro, extraordinário, pessoa muito honesta, perdeu a eleição. O outro foi o Maurício Rands. Eu não conhecia Maurício Rands, nos fizemos amigos na Comissão. Esse nunca discriminou.
Por que pensou em parar no final daquela segunda legislatura?
Ora, meu voto sempre foi independente. Como é que eu poderia me comunicar com a população se não fosse através do outdoor? É o único meio de comunicação de massa que o político de classe média pode bancar com seus recursos. Um deputado para receber milhões, ele tem que prestar serviços e eu não tenho vocação para lobista. Nunca fiz lobby. Aliás, nem advogo como deputado, para não misturar as coisas.
Pensa em retomar?
Estou reiniciando a convite de um filho, que é advogado, para trabalhar com ele. Mas, é claro, que a minha prioridade, no momento, é escrever alguma coisa.

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