domingo, 11 de julho de 2010

Saiba como Arraes perseguiu Hermano Alves e outros brasileiros que se exilaram na Argélia, pós-64.

Hugo Gomes de Almeida:

Hélio: o Hermano Alves chegou a ter algum choque pessoal com Carlos Lacerda ou a separação foi ditada tão só pelos embates políticos?
Esclareça como se manifestou o veto sofrido na Argélia, da parte de Miguel Arraes. Pelo que tem afirmado, alguns brasileiros tornaram-se vítimas desse mesmo comportamento do ex-governador de Pernambuco. Tenha a gentileza de projetar luzes sobre esse fato, que já pertence à História”.

Adriana Veloso Alves:
Prezado Sr. Helio Fernandes, agradeço pela lembrança da figura de meu pai, pessoa extremamente idealista, brilhante e que lutou bravamente pela liberdade no Brasil que ele tanto amava e não soube reconhecê-lo como uma das maiores mentes deste país.
Gostaria apenas de retificar que meu pai não repudiava o Brasil, ele amava de paixão. E sim, ele queria viver no Brasil. Sua saída do Brasil para viver em Lisboa foi justamente por ter, pela segunda vez, as portas fechadas como profissional. Na década de 80 seus inimigos ainda lhe perseguiam de forma indireta mas bem intensa.
Seu brilhantismo era um perigo para muitas figuras políticas e militares de nosso país.
Quanto à pergunta do Helio Gomes de Almeida, posso esclarecer.
Com Lacerda a desavença foi política, e quanto ao Miguel Arraes, eu mesma (aos meus 11 anos de idade) pude presenciar a atitude de coronelismo do Arraes na Argélia”.

Hugo Gomes de Almeida:
“Agradecido, dona Adriana Veloso Alves. Gostarei, quanto lhe seja possível, que esclareça como se traduziu a atitude de coronelismo do Arraes na Argélia”.

Adriana Veloso Alves:
Prezado Sr. Hugo, é dificil esclarecer as “atitudes coronelistas”.
Estamos falando de um homem público também falecido. Portanto, sem querer ofender a dignidade de alguém que não está aqui para se defender (Arraes), alguns relatos posso me permitir de fazer.
Quando chegamos na Argélia, meu pai, minha mãe e meus 4 irmãos, transtornados pela fuga para o exílio, meu pai esperava ter apoio desse Sr. Arraes .
Sem termos dinheiro, casa ou qualquer apoio para a sobrevivência da família, meu pai procurou aquele que ele tinha ajudado a se exilar na embaixada da Argélia em 64 .
Esse Sr. Arraes simplesmente exigiu fidelidade incondicional a ele em seu reinado em Argel (capital da Argélia) e logicamente outras exigências que ficaram em segredo.
Meu pai, em toda sua vida, NUNCA foi homem de pactuar com politicalha (como diz nosso amigo Helio Fernandes) e nem de aceitar propostas que fossem contra seu idealismo de justiça.
E por não aceitar as exigências de Arraes, sofremos então uma perseguição e vingança barata e mesquinha deste individuo. Pior ainda, a vingança atingiu a nós, os filhos, que não podíamos nos matricular em nenhuma escola (tanto era o poder de Arraes essa época na Argélia), não podíamos fazer nada, e depois não podíamos nem sequer sair do país.
Após 8 meses encurralados na Argélia, e depois de ter acontecido um episodio terrível, tivemos finalmente a ajuda da França para sairmos do país .
Existem muito mais coisas a serem esclarecidas com o tempo .
Espero que este relato seja suficiente para convencê-lo do “coronelismo ” do Sr. Arraes.
E acredito que ele tenha feito isso com outras pessoas .
Abraço”.

Comentário de Helio Fernandes:
Adriana, tendo conhecido tanto e durante tanto tempo o Hermano de Deus Nobre Alves, não podia deixar de registrar, o mais resumidamente possível, toda a admiração que tinha por ele. Sabia de ciência própria o que ele sentia pelo país. Mas teve que viver no exterior, por causa da perseguição que sofria, mesmo depois da ditadura, como você mesma confirmou.

Aproveito esse elucidativo diálogo entre você e Hugo Gomes de Almeida para ajudar a esclarecer dois outros fatos escritos por mim, antes, e que vários leitores e seguidores pediam que explicasse melhor. E que estão citados na tua resposta.

Não houve nenhuma grande desavença entre ele e Lacerda, não tiveram nem oportunidade. Depois de 1968 nem se encontraram, um não sabia onde estava o outro. O drama de Hermano começou no dia 13 de dezembro de 1968, quando foi publicada a mais cruel e selvagem lei, chamada de “AI-5, sigla de Ato Institucional nº 5”.

Como já contei, foram terríveis a forma e o trajeto percorrido por Hermano até chegar à Argélia. Lacerda foi preso no mesmo dia 13, cassado no dia 30 desse mesmo dezembro de 1968. No dia 2 de janeiro de 1969, viajou para Milão, teve a gentileza de ir se despedir de Mario Lago e deste repórter, que continuavam na cadeia.

Como Lacerda morreria inesperadamente, mocíssimo, (63 anos), ele e Hermano teriam 8 anos para essa tão falada “desavença”. Nesse maio de 1977 nem sei onde estava Hermano. O que sei: Lacerda (da mesma forma que Jango e Juscelino) desapareceu perto do fim da ditadura, numa “coincidência” que tem todas as aspas possíveis, e jamais será esclarecida.

O certo e indiscutível: se não tivessem morrido, os três influenciariam positivamente o fim da ditadura. Ou então, invertendo a colocação, se os três não tivessem desaparecido, a ditadura não teria terminado como terminou, “amigavelmente”, com todos os civis e militares, preservados, protegidos, favorecidos.

***

PS – Agora Arraes, que a filha de Hermano de Deus Nobre Alves, com 11 anos percebeu que era “coronelista”, foi muito mais. Tendo feito acordo com os generais golpistas, recebeu passaporte para viajar para onde quisesse.

PS2 – Ao contrário de Jango, Brizola, Hermano, Márcio Moreira Alves e outros, que tiveram que sair do país depois de intensa peregrinação geográfica e policial.

PS3 – Arraes escolheu a Argélia, dominada pela ditadura comunista do corrupto Boumedienne. Foi para lá por escolha voluntária, ditadura comunista, tudo o que mais desejava.

PS4 – Todos os outros exilados chegaram à Argélia por ser o ponto mais fácil, saindo do Brasil. Não imaginavam que depois de 4 ou 5 meses, chegaria aquele no qual acreditavam e que se transformaria no carrasco de todos.

PS5 – Com penetração total na ditadura comunista da Argélia, seu Poder era incontestável, chamado normalmente de “Vice-Rei”, com tudo o que um cidadão, nessa condição, receberia. E aproveitou muito bem.

PS6 – Fez fortuna, e não digo isso agora, escrevi muito sobre Arraes, assim que acabou a ditadura (É só verificar na Tribuna da Imprensa ou na Biblioteca Nacional).

PS7 – Arraes consolidou de tal maneira a sua força, que quando Boumedienne foi derrubado, (e depois assassinado em Paris, onde vivia luxuosamente, como o “Papa-Doc” e outros), ficou com o mesmo prestígtio com o novo ditador.

PS8 – Boumedienne perdeu o poder porque roubou demais, e não dividia corretamente. Não ficou um só brasileiro na Argélia de Arraes. Assim caminha a humanidade.

Por Helio Fernandes/Tríbuna da Imprensa

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